segunda-feira, 29 de abril de 2013

AS putas LITERATAS - por Vinícius Linné

'two prostitutes' by *cellar-fcp


Propagam-se as putas na calçada, literatas agora. É exigência do governo, coisa de nova lei. Para ser puta precisa saber escrever e fazê-lo de alguma forma. Algumas levam máquinas de escrever portáteis à mão. São putas vintage, românticas. Depois do sexo, sêmen ainda escorrendo nas pernas, elas colocam a máquina sobre o colo e a metralham docemente. Escrevem um conto ou dois, mal pontuados, e depois afixam em postes de iluminação pública, com a devida assinatura, numa ação quase que panfletária.

As putas mais baratas, aquelas comuns, as que fazem a coisa toda pelo dinheiro mesmo, escrevem em folhas de caderno pequeno. Escrevem com caneta bic e depois rasgam a folha e entregam para o cliente que, exasperado, amassa e joga na primeira lixeira – geralmente o chão – com medo de que a mulher encontre o relato ou conto.

Há putas poetisas com papeis de carta que cheiram a rosas – e cabelos que cheiram a cigarro. Essas são caras. Essas são as melhores formadas, as que cursaram mestrado ou algum doutorado até. Sabem a diferença entre um verso jâmbico e um helênico. O que de pouco serve. Não raro os clientes limpam o pau em seus poemas.

Há um outro tipo que com a popularização do acesso à internet tem se propagado como praga. A puta de blogs. Embora insistam que são todas diferentes, com estilo próprio e talento ainda não consagrado, não passam do tipo de putas que dão porque querem. Querem fama, querem fotos, querem filmes. Querem dinheiro e querem, acima de tudo, livrar-se do nojo que são os homens. E da maldição que é ter que escrever.

Logicamente, há ainda as dissidentes. As putas analfabetas. Vivendo escondidas, dando nas sombras, levantando a bandeira da ilegalidade que sempre honrou nossa ordem e progresso. Putas da resistência, elas negam-se à formação e ao sistema da escrita. Putas radicais e putas livres. Putas que mantêm o anonimato e que só transformam o cliente em protagonista do que acontece entre suas pernas. Putas muito procuradas, pelo que dizem, pelos literatos, cansados da concorrência das outras.

6 comentários:

  1. Gosto dessa literatura e dessa logística puta e letrada. Dessas consoantes que escorrem porra e das vogais que só pensam em voltar pra casa e dormir.

    Gosto de esperar um texto seu. Toda segunda há algo bom pra ler, muito bom.

    Bjs,
    Huck

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    1. Valeu, Huck.

      Sua leitura é sempre de dar estrelas nos olhos.

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  2. A concorrência é desleal, ou não, pois seguem sua natureza.

    Gostei muito!

    Abraços

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  3. Texto lindo,Linné.
    É sempre uma coisa boa ler seus textos . "Puta" é um mistério que eu gosto de pensar.
    Um xero.

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