terça-feira, 16 de julho de 2013

aNA - por Adilma Alencar.

Esquina lotada, calçadas entupidas de homens e mulheres, a renda por baixo das saias, as rédeas repousavam na fala,marcavam só um erotismo dissolvido no cheiro doce dos perfumes misturados à fumaça. A música era sons de todas as falas numa rua, era fácil adivinhar que o corpo - embaixo de sobretudos escuros, saias laranjas vestidos de bolinhas, calça verde, camiseta e calça jeans, - queria gozar uma falta de amor.
Sozinha, no canto do bar Ana fumava, fumava como se cada tragada fosse um carinho erógeno, os músculos da face ruborizada relaxavam, e o cigarro, antes de todos, recebia o batom vermelho e vibrante dos lábios dela.
Olhar arisco e fugidio. Ela pousava o olhar na rua. Um olhar que cabia homens e mulheres, bêbados, putas, padres e crianças. Ana era toda generosidade e corpo, os cabelos curtos e cacheados convidavam as mãos anônimas para passeios na nuca.
Um escapulário prata pendurado ao pescoço era contraste do seu olhar ateu. No drinque vermelho duas rodelas de limão descansavam a acidez e a língua de Ana já alisava as pedras de gelo enquanto bebia irresponsavelmente com o dinheiro do leite, da mistura, do aluguel.

Vinte anos e um filho pra criar. Tesão, abismos, voos adiados e um filho pra criar.
Um homem à espera e um filho pra criar.
Ana fumou o último cigarro, pagou o drinque e voltou pra casa antes de seu marido chegar, pegou o filho e se desculpou pelo atraso, sua sogra fica com o menino aos sábados.
Ela colocou Pedro no colo, chorou e ninou o seu homenzinho, o colocou no berço, ligou no noticiário.

Avental no corpo, Ana seguiu cortando cebolas e chorando.

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